A convite da Associação Comercial e Industrial de Ijuí (ACI) e do Sindilojas, a Direção do SindiComerciários de Ijuí esteve presente em reunião realizada na tarde de ontem (27) na seda da ACI. A pauta proposta pelas entidades patronais era a “modernização da legislação trabalhista e a geração de postos de trabalho”, mas que no fundo, debateu a imposição do “horário livre” no comércio por empresa que deseja se instalar em nossa cidade.

 

A reunião foi coordenada pelo presidente da ACI, Nilo Leal. A mesa de debates foi composta pelo secretário de desenvolvimento econômico Antônio Tâmbara, presidente do Sindilojas Bruno Hass, presidente do legislativo Rubem Jagmin, vice-prefeito Valdir Zardin, prefeito Valdir Heck e pelo presidente do SindiComerciários, Ari José Bauer. A diretora Rosane Simon e o assessor jurídico do Sindicato, Luiz Carlos Vasconcellos também participaram da reunião, Rosane representando a Fecosul, como sua 2ª vice-presidente.

 

A reunião foi dominada pelo discurso empresarial e patronal em que a “modernização e a atualização”, seriam alternativas para a cidade crescer, como disse Bruno Hass, do Sindilojas. Para justificar o discurso maquiado de uma pretensa modernização e atualização, foram usadas pelos defensores da proposta como justificativas, argumentos que confundem o trabalho essencial nos hospitais, por exemplo - que tem legislação, jornadas, turnos e folgas específicas da função – com o trabalho no comércio, o combate ao desemprego e o desenvolvimento da economia regional.

 

 

Mesmo teor argumentativo usado pelo prefeito Valdir Heck. O prefeito declarou ainda que o secretário de desenvolvimento econômico teve respaldo e falou em nome do executivo quando se encontrou com os representantes da empresa Havan. “A mudança do horário não é só pela Havan. É preciso pensar maior o município. Sou da opinião que o município tem que abrir à esse horário e depois Deus vai nos ajudar, com Havan ou sem Havan”, argumentou.

 

O secretário Antônio Tâmbara foi questionado sobre o que há de concreto sobre a instalação da empresa na cidade. Evasivo, iniciou seu discurso expondo dados sobre o movimento de pessoas no SINE, que no ano passado teria atingido o volume de 20000 pessoas. Mas reconheceu que no momento há somente a palavra do dono da empresa sobre a possibilidade de se instalar em Ijuí. Segundo ele, a empresa não quer nenhum incentivo público de contrapartida, mas exige o “horário livre” para o funcionamento do comércio.

 

Ari Bauer, do SindiComerciários, voltou a deixar claro que o Sindicato em nenhum momento se posicionou contra a vinda desta ou de qualquer outra empresa para a cidade e que a entidade é parceira na construção de alternativas para romper o ciclo de crise, de queda da renda e de desemprego que assola o país, mas que representa a categoria comerciária e que esta tem posição decidida em assembleia, contra o horário livre. Relatou que só em Ijuí são mais de 5000 trabalhadores no comércio que seriam afetados pela medida. “Queremos um amplo debate com todos os setores da sociedade e da economia que possam agregar ideias que contemplem a todos, inclusive as famílias dos trabalhadores no comércio”.

 

O Sindicato distribuiu às lideranças presentes, estudo que encomendou junto ao DIEESE (Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos), com dados econômicos de Ijuí. Estes dados, coletados da última RAIS (2016), base estatística do Ministério do Trabalho, mostra que das 1037 empresas comerciais de Ijuí, a maior parte delas (70,4%), são micro e pequenos estabelecimentos com até 4 empregados. O documento exemplifica que estes estabelecimentos podem ser afetados no processo de concorrência com grandes grupos comerciais, dada a escala e poder econômico destes grupos, que impõem aos seus fornecedores condições abusivas nos contratos, seja em relação a preços, seja em relação a prazo de entrega. Com isso, o pequeno comércio fica cada vez mais a margem do mercado, não tendo as mesmas condições de competir, o que inviabiliza suas atividades, afetando, obviamente, os empregos e consequentemente a renda das famílias.

 

“Há um ciclo econômico que não pode ser ignorado. Por isso não queremos decisões tomadas a revelia do amplo debate, sobre imposições que desconsiderem o impacto para o emprego e a renda que os dados econômicos deixam explícitos. Além disso, a mudança da legislação para o funcionamento do comércio impacta diretamente as famílias. Por exemplo, um casal com filhos, em que ambos trabalham no comércio, em estabelecimentos diferentes. Um tem folga na quarta-feira, outro na sexta-feira, enquanto os filhos estão na escola. No domingo, quando os filhos estarão em casa, ambos estarão no trabalho. Quem cuidará das crianças? Quando esta família estará reunida?”

 

Dados, também da RAIS, demonstrando a variação de postos de trabalho no comércio em relação ao PIB (2016), mostram que a evolução de postos de trabalho no comércio acompanha o nível de atividade e está correlacionada com o crescimento econômico. Estes dados desqualificam o argumento da geração de novos empregos como mola mestra da defesa de funcionamento do comércio aos domingos. O que de fato cria novos empregos é o nível de atividade, o crescimento econômico (PIB) e a redução da jornada. Ademais, não tem nenhuma comprovação que o trabalho aos domingos aumenta o volume de vendas, o que tende a ocorrer é sua redistribuição entre os dias da semana.

 

 

 

Após as argumentações da mesa, houve espaço para manifestação dos presentes. Chamou a atenção o relato do vereador Ricardo Adamy, que apresentrou lista não oficial de 3 etapas de investimentos da empresa Havan no estado. Segundo ele, Ijuí estaria em uma terceira etapa, a ser concretizada em 2019 ou 2020.

 

Em suas falas, os vereadores Ricardo Adamy (PMDB), Andrei Cossetin (PP), Marcos Barriquelo (PDT), César Busnello e Jeferson Dalla Rosa (PSB) se mostraram favoráveis ao “horário livre”. Os vereadores Beto Noronha (PT), Edmilson Mastella e Marildo Krombauer (PDT), não se pronunciaram. Para o vereador Andrei Cossetin, proponente do projeto que revoga a atual legislação de regulação do horário do comércio, a cidade deve ser “24 horas” e a revogação deve se dar imediatamente, sem debates. “Muitos comerciários inclusive, querem shopping e usam postos de gasolina, hospitais, locais em que pessoas trabalham domingos e feriados. Não devemos perder e gastar tempo com debates. O estado inteiro está atrás da Havan e temos que tirar este empecilho para a vinda à Ijuí”, defendeu.

 

O vereador César Busnello foi mais longe. Argumentou que há empresas em Ijuí em que os trabalhadores brigam para trabalhador todos os domingos, para aumentar a renda. Disse que o PSB, seu partido, entrou nesta semana com uma ação direta de inconstitucionalidade contra a lei que regula o horário do comércio, por considerar que esta impede a livre concorrência e livre iniciativa entre as empresas.

 

Única voz ponderada entre os que se manifestaram, o vereador Junior Piaia (PCdoB) lembrou que o tema é polêmico e que este suscita posições que não podem ser intransigentes. Para ele, é preciso reconhecer que todas as posições têm legitimidade no debate. Argumentou que a forma como o secretário de desenvolvimento econômico tratou a questão, sem conversa prévia com os setores envolvidos, para gerar construções e acordos que superassem as diferenças de pensamento, criou um clima de exaltação desnecessário.

 

“Não podemos inverter o debate sobre geração de emprego e renda. Estamos fazendo isso quando partimos da premissa de que a mudança desta lei é o princípio. Precisamos fazer o debate não por imposição de uma empresa. A geração de emprego e renda tem variáveis em relação ao município e sua caracterização só será sustentável ao médio e longo prazos se as variantes econômicas e sociais forem consideradas”, defendeu.

 

Piaia, que é economista e foi professor do curso de economia da Unijui, defendeu também a discussão de um programa mais amplo para o desenvolvimento. “Ficamos na inércia por muito tempo e se continuarmos nesta mesma inércia nas outras questões que são importantes para um desenvolvimento mais abrangente no município, corremos o risco de perder o pouco que conquistamos”. Para ele, é preciso que o executivo e o legislativo atuem como agentes de um pacto entre os setores, pois sem um acordo que envolva a todos, as diferenças que sobrarão de uma decisão imposta a um determinado setor gerará no futuro a perda do empuxe necessário para que o município aproveite todas as possibilidades econômicas que prováveis investimentos venham a trazer para Ijuí.

 

Como decisão da reunião, uma comissão formada pelo executivo, pelo legislativo, ACI, Sindilojas, SindiComerciários e Unijui se reunirá para debater a questão e dar encaminhamentos. “Este é um debate antigo. Em vários momentos da economia, bons e ruins, ele volta. O que estamos reivindicando é que o debate considere a opinião da nossa categoria, oriunda de assembleia, contrária a liberação de horário. É preciso ter acordos, regulação. A livre concorrência e livre iniciativa são argumentos que enxergam somente o lado empresarial. Lamentamos que não vimos um olhar mais profundo para a vida dos trabalhadores, não só defendendo a geração do emprego e da renda, mas também defendendo um bom salário e condições de trabalho. Se um trabalhador briga para trabalhador domingos, não é por que ele quer, é porque ele ganha pouco, o salário é baixo. Estamos abertos ao debate. Queremos construir, desde que sejamos ouvidos”, comentou Rosane Simon.